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O que aconteceu com o Credit Suisse? Tudo o que você precisa saber

15min de leitura

Misael Guedes

Misael Guedes

Redação

Nos últimos dias todos nós acompanhamos de perto o drama no mercado norte americano com a quebra de alguns banco regionais, entre eles o SVB, ou Sillicon Valley Bank.

E poucos dias depois já nos vimos diante de um episódio ainda maior, a quebra de um dos maiores e mais tradicionais bancos do mundo, o Credit Suisse, que acabou sendo comprado pelo UBS (outro gigante suíço) por US$3,25 bilhões.

O acordo foi intermediado pelo Banco Central Suíço que não permitiu que o Credit Suisse quebrasse por conta de toda a sua história e todo o impacto que esse acontecimento desencadearia.

Para quem está mais imerso no mercado o assunto talvez seja a cereja no bolo do Credit, que já não vinha bem das pernas (ou dos bolsos) a bastante tempo.

Ao fim do ano passado o prejuízo nos resultados do banco era de US$ 1,51 bilhão, isso só o quarto tri. Esse havia sido o quinto resultado com prejuízo seguido, ou seja, o banco já estava a mais de um ano dando prejuízo.

Neste artigo vamos contar tudo o que sabemos e o que gostaríamos que você também soubesse sobre a crise do Credit Suisse.

O que você verá por aqui:

  • Quem é o Credit Suisse?
  • A situação delicada do Credit Suisse
  • Como o UBS salvou o Credit Suisse?
  • Qual a relação entre o caso SVB e o do Credit Suisse?
  • Quais as consequências dessa quebra para o mercado?
  • Como essa crise pode afetar o Brasil

Quem é o Credit Suisse?

A história do Credit Suisse começa lá atrás em 1856, isso mesmo, 167 anos atrás, quando o político e empreendedor Alfred Escher fundou o Schweizerische Kreditanstalt (SKA) para financiar a expansão da rede ferroviária e promover a industrialização suíça.

Alguns anos depois, após ter sucesso em seus planos iniciais, o SKA abriu seu primeiro escritório para representá-lo fora da Suíça, o local escolhido foi Nova York. Alguns anos após isso abriu a primeira filial fora de Zurique, em Basel.

O First Boston se tornou o primeiro banco de investimentos de capital aberto nos Estados Unidos em 1934, e o fato dele estar nessa história você vai descobrir daqui a pouco, mas tenho certeza que você vai ligar os pontos logo.

Poucos anos depois a SKA criou a Swiss American Corporation, ainda em Nova York, para concentrar os negócios de empréstimos, seguros e investimentos.

Em 1964 o SKA finalmente conseguiu a licença pra atuar como um banco completo, o famoso full-service ou múltiplo.

Em 1977, um escândalo empurrou o SKA pra se tornar um grupo financeiro internacional.

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O escândalo de lavagem de dinheiro Chiasso Affairleva o SKA a uma perda histórica para o banco que nem era Credit Suisse ainda. Esse foi um dos piores escândalos da história bancária suíça. Devido ao tamanho das quantias envolvidas e à imagem do Crédit Suisse como instituição financeira respeitada em um país conhecido por seus bancos, o escândalo de Chiasso abalou a nação.

Entre seus resultados de episódio estavam os esforços para melhorar a supervisão da comissão bancária federal, o aumento do autopoliciamento do setor bancário e uma iniciativa projetada do Partido Socialista (que governava o país na época) para controles bancários mais rígidos do governo.

E se você quiser que a gente conte melhor essa história que é uma das mais intrigantes e causou um grande impacto no sistema bancário mundial nos avise. Tenho certeza que você irá se surpreender com o desfecho dessa história. História que eu tenho certeza que você não leu em lugar nenhum.

Voltando a história do Credit Suisse, viajando para a década de 80, o SKA se torna o primeiro banco suíço com assento na Bolsa de Valores de Nova York, através de uma subsidiária, nesse momento foi criada a CS Holding, como empresa irmã da SKA para ficar com as participações em empresas industriais.

Lembra do First Boston? No fim da década de 80 a CS Holding compra 45% do banco americano como parte de um acordo de resgate, o banco foi renomeado como CS First Boston, os dois já haviam operado juntos uns anos antes lá na bolsa de Londres, na área de renda fixa.

Um ano depois, a CS Holding se tornou a controladora do grupo SKA e poucos meses depois já assume o controle do CS First Boston e aproveitou o embalo pra comprar o Bank Leu, um banco privado suíço.

Após um monte de aquisições a CS Holding finalmente deixa de ser a CS Holding e se transforma no Credit Suisse Group e o nome SKA fica no passado.

Em 1998, os suíços decidiram comprar um dos mais históricos bancos de investimento do Brasil: o Banco Garantia - fundado por Jorge Paulo Lemann - e se estabeleceram como um dos maiores bancos de investimento do país.

Além do Garantia, em 2006 o banco suíço adquiriu a Hedging-Griffo - uma das gestoras de fundos de investimento de maior sucesso no Brasil, comandada pelo lendário Luis Stuhlberger.

Mais algumas aquisições e reorganizações na carreira e chegamos ao arrepiante ano de 2007 e o banco passa pela tempestade do subprime sem precisar de um resgate estatal, ao contrário do UBS (parece que o jogo virou anos mais tarde).

Inclusive foi nessa época que o UBS vendeu o Pactual (que havia se tornado UBS Pactual) para o BTG, dos mesmos fundadores, que se tornou o BTG Pactual.

Em 2018 o Banco se viu mais uma vez exposto a problemas de governança, mais uma vez lavagem de dinheiro. No episódio, o órgão de fiscalização suíço Finma detonou a reputação do banco dizendo que o Credit Suisse falhou em combater adequadamente a lavagem de dinheiro em casos envolvendo o banco, a FIFA, a PSDVA e a Petrobrás nos anos anteriores.

Basicamente o esquema foi descoberto e o Credit Suisse ao invés de agir de acordo com o estatuto para casos de corrupção aumentou o salário do executivo envolvido.

O Credit Suisse disse em fato relevante que o órgão fiscalizador encontrou “fraquezas do legado e que agiu para melhorar a conformidade desde que o CEO Tidjane Thiam assumiu o banco em 2015. Bela forma de melhorar a conformidade né?

O Finma disse que as falhas aconteceram repetidamente ao longo de muito anos, principalmente antes da Copa do Mundo de 2014. O órgão também afirmou que a maioria desses problemas vieram da subsidiária do grupo Clariden Leu AG, absorvida pelo Credit em 2012.

Mas o stopim para o CEO Thiam, que já não tava com a moral em dia com todo mundo, foi um caso de espionagem interna cabuloso em 2019. O caso chocou a Suíça (mais uma vez).

Thiam usou o banco para contratar espiões para ficar de olho (estou sendo gentil aqui) em alguns ex-executivos do banco, mas essa é história pra outro dia.

Em 2021, o Credit Suisse foi condenado a pagar ao FMI o valor de US$ 475 milhões, por ter escondido que ajudou na coordenação do empréstimo de US$ 2 bilhões para Moçambique.

E no ano passado, 2022, surgiu uma investigação contra o banco acusando o Credit e uma ex-funcionária de lavar dinheiro da máfia búlgara, o que levou o Credit Suisse a ser o primeiro banco do mundo a ser alvo de uma ação criminal, segundo a investigação um total de 146 milhões de euros foram lavados através das contas do banco.

Traremos todos esses escândalos depois em artigos separados, com detalhes únicos. Vamos seguir com o momento atual do Credit Suisse.

A situação delicada do Credit Suisse

A situação como a gente pode ver já não era estável nos últimos anos mas desde 2021 o banco vem passando por uma verdadeira liquidação das suas ações. O que deu o start nesse processo de declínio foi as perdas que o banco teve por conta de duas grandes crises.

O colapso da financeira britânica Greensill e do fundo multimercado norte-americano Archegos, os dois juntos foram responsáveis por perdas de muitos bilhões de libras.

Com isso o banco entrou num forte processo de reestruturação com a troca da administração novamente.

Dando uma resumida no caso de Greensill, a empresa emprestava dinheiro pra outras empresas, que pagavam seus fornecedores e logo depois a Greensill empacotava essas dívidas em títulos de securitização para revender a investidores.

O modelo desse negócio começou a gerar desconfiança e no início de 2021 a empresa declarou a falência, o que gerou um prejuízo de US$ 10 bilhões para os clientes do Credit Suisse.

O segundo nocaute veio pouco tempo depois, com o caso do family office Archegos Capital, de Bill Hwang, investidor da Coreia do Sul instalado em Nova York.

O escritório de Hwang administrava US$ 10 bilhões, mas com uma boa narrativa e uma boa lábia convenceu diversos bancos a liberarem o montante final de US$ 30 bilhões para investir mais. Em 2020, ele deu tacada alavancada nas ações da empresa ViacomCBS, que com isso, viu os preços das ações dispararem.

Porém, algum tempo depois as ações caíram e o Archegos não conseguiu segurar as perdas com os empréstimos que pegou com os bancos e quebrou gerando uma perda de US$ 5,5 bilhões para o CS.

A partir desse momento as ações foram caindo, caindo, caindo e não pararam mais de cair.

Pulando pra 2022, o banco contratou Ulrich Koerner, especialista em reestruturações para assumir o comando do banco. Porém apenas dois meses depois, Koerner viu as ações do banco despencarem com rumores de que o banco não tinha capacidade de se reestruturar para se manter funcionando sem pedir mais dinheiro.

O CDS, seguro contra calote numa linguagem mais simples, disparou para níveis semelhantes ao da crise de 2008, aumentando demais a crise de confiança no Credit Suisse.

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Nessa ocasião o banco foi salvo por um levantamento de capital, onde o Saudi National Bank adquiriu uma participação de quase 10%, se comprometendo a investir até US$ 1,5 bilhão.

Mas o banco não conseguiu conter a sangria de clientes. Só no quarto trimestre de 2022 as retiradas de clientes nos fundos do Credit Suisse superaram os US$ 120 bilhões, o que gerou o maior prejuízo desde a crise de 2008. 7,29 bilhões de francos suíços, ou US$ 8 bilhões.

Pouco tempo depois de divulgar os resultados péssimos, o CEO do Banco Nacional Saudita informou que não poderia injetar mais dinheiro no banco, mas não por não querer e sim por questões regulatórias, acontece que o banco saudita já possui 9,88% de participação no Credit Suisse, não poderia ultrapassar os 10% de participação.

Só que tudo isso acontece no mesmo momento que o SVB tava quebrando lá do outro lado do oceano, e caso você não tenha lido ainda o nosso artigo sobre o assunto, te aconselho a passar lá assim que acabar aqui, é o artigo mais completo sobre o assunto que você vai encontrar na internet.

Com isso as ações afundaram de vez e as negociações tiveram de ser travadas após caírem pra menos de 2 francos suíços. Na noite do mesmo dia o Credit Suisse anunciou que pretendia exercer a opção de pegar empréstimos de até US$ 53 bilhões com o Banco Nacional Suíço por meio de uma linha de crédito e uma linha de liquidez de curto prazo.

O Banco Nacional Suíço e o governo confirmaram a liberação dos recursos numa forma de tentar acalmar os ânimos e enquanto isso intermediou um acordo com um velho conhecido do Credit Suisse, o também gigante UBS.

A linha do tempo da sangria do Credit Suisse:

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Como o UBS salvou o Credit Suisse

No fim de semana passado, 19/03, o UBS concordou em comprar o Credit Suisse por US$ 3,25 bilhões, o que cria um dos maiores bancos do mundo com quase US$ 1,7 trilhão de ativos totais, o movimento foi importante principalmente para evitar a escalada da crise de confiança pela Europa e Estados Unidos.

Junto à isso, o Fed e outros 5 bancos centrais anunciaram ações conjuntas para aumentar a liquidez aos mercados financeiros. Embora o anúncio tenha tranquilizado um pouco a situação, alguns pontos podem ser observados.

Os títulos de maior risco do Credit, US$ 17 bilhões, não foram incluídos na venda para que o UBS conseguisse realizar a compra. Isso acabou gerando um nova onda de incertezas. A maior delas era a de que eles poderiam estar expostos a um risco maior do que acreditavam estar. Em tempos de juros altos, você sabe, o apetite ao risco vai lá pra baixo.

Entre esses títulos de maior risco está o “Additional Tier 1 Bonds”, um título muito parecido com os bonds perpétuos, ou seja, não possuem vencimento, não possuem garantia e não podem ser convertidos em outros títulos.

Nesse caso, ao invés do banco pagar o valor do título comprado pelo investidor, ele paga juros ao comprador do título. Só que quando o capital de um banco cai num nível abaixo do mínimo requerido, o regulador tem duas opções: pode forçar a conversão desses papéis em novos títulos ou pode simplesmente eliminá-los, que foi o que aconteceu com o Credit Suisse.

No dia seguinte ao anúncio da compra, 20, as ações desabaram 55%, nesse caso foi um ajuste, o valor da empresa precisava se adequar ao valor da compra. O UBS por sua vez ofereceu uma ação sua para cada 22,48 ações do Credit Suisse. O banco fechou em alta no dia mesmo após ter caído 16% durante a sessão.

A missão parece ter sido concluída observando que as ações do setor no geral apresentaram melhoras ao longo do dia. Mas ainda resta um pouco de incerteza quanto a outras instituições estarem na mesma situação do Credit. O mercado acompanha atento.

Nós preparamos um vídeo sobre o assunto, então se quiser outros detalhes, não deixe de conferir!

Qual a relação entre o caso SVB e o do Credit Suisse?

Depois de tudo isso você se perguntar: Qual a relação do SVB com o Credit Suisse? E a resposta é bem simples, tirando o fato dos dois serem grandes bancos com problemas, não há nenhuma relação entre os dois.

O problema do SVB foi um problema contábil, de descasamento entre os ativos e passivos, onde não possuíam liquidez suficiente para cumprir suas obrigações.

Já o Credit Suisse já vem enfrentando uma crise de confiança a muito tempo, com várias operações duvidosas, quebras de fundos e envolvimentos em esquemas de espionagem e lavagem de dinheiro para a máfia.

É possível e provável que o caso do SVB tenha minado ainda mais a confiança sobre o Credit, e uma sucessão de fatos acabou derrubando as ações a patamares insustentáveis. Primeiro a declaração de que foram encontradas “fraquezas materiais” nos controles internos e nos balanços.

Depois o presidente do Saudi National Bank disse que não colocaria mais capital no banco suíço. Com todo esse cenário de caos, a sensação era de que uma verdadeira crise bancária.

Quais as consequências dessa quebra para o Brasil?

Há um consenso que esses episódios impactem pouco o mercado financeiro brasileiro, nosso sistema bancário é muito bem regulado. Temos bem mais regulações e procedimentos mais rígidos que acabam protegendo a liquidez e solidez dos nossos bancos.

As quedas recentes estão mais atreladas ao momento da economia no geral, com taxas de juros mais altas é normal que os ativos de bolsa apresentem quedas, o apetite ao risco é deteriorado e os investidores buscam retornos menos voláteis na renda fixa e outros produtos.

Houve muitas especulações e geração de pânico por parte de algumas pessoas buscando engajamento dizendo que o Nubank, Inter e C6 estavam correndo sérios riscos de quebrar por conta da quebra do SVB e depois Credit Suisse, mas todas as instituições negaram em fatos relevantes possuir qualquer exposição.

Essa solidez é fruto de uma vida inteira num país com histórico de altas inflações e insegurança política e jurídica, o cenário por aqui é sempre incerto, e as regulações ajudam as instituições a permanecerem sólidas mesmo em períodos de altas taxas de juros.

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