Economia

O que fazer em períodos de hiperinflação?

5min de leitura

Leandro Siqueira

Leandro Siqueira

Estrategista de Investimentos, Co-fundador da Varos

Você tem noção do comportamento dos investidores em períodos de hiperinflação, como no Brasil nos anos 90?

Caso não, esse artigo pesquisou a fundo sobre isso e traz algumas respostas inesperadas.

Imagem de capa do estudo

Pouco se sabe sobre como investidores respondem a períodos de inflação extremamente elevada. O artigo explica que a literatura fornece duas hipóteses para essa questão, mas que são teorias conflitantes.

A hipótese de hedge acredita que os investidores são mais propensos a comprar quando a inflação esperada aumenta.

Segundo ela, os investidores entendem que as ações dão direito a uma fração da renda gerada pelos ativos, preservando o valor real dos investimentos.

Já a hipótese da ilusão monetária sugere que os investidores são menos propensos a comprar e mais propensos a vender nessa situação.

Isso porque eles ajustam as taxas de crescimento nominais, mas ignoram que os fluxos de caixa das empresas também crescem com a inflação.

Assim, os investidores acabam exigindo maiores rendimentos (dividendos) para manter as ações. Baseado nisso, os autores deram um ponto de partida em suas pesquisas.

Eles resolveram investigar qual das hipóteses mais se encaixa no comportamento desses indivíduos.

Para isso, foi usado um conjunto de dados contendo carteiras de investimentos de mais de 2000 clientes de um banco alemão entre 1920 e 1924, período da hiperinflação alemã.

A análise foi feita com base na relação entre dois principais indicadores.

O primeiro deles é a inflação alemã.

O segundo é o desequilíbrio entre o volume de compra e venda dos indivíduos.

Equação feita pelos autores

Para iniciar as análises, primeiro os autores classificaram as cidades alemãs em decis com base na sua inflação.

Então eles calcularam o desequilíbrio médio de compra-venda para cada decil.

O resultado foi uma forte relação negativa entre os decis e os desequilíbrios.

Ou seja, quanto maior a inflação, menor o apetite de compra. Fato que vai de acordo com a hipótese da ilusão monetária.

relação entre os decis e os desequilibrios

Como correlação não necessariamente implica causalidade, os autores realizaram uma regressão entre a inflação local e o desequilíbrio compra-venda.

Regressão linear feita pelos autores

A regressão contou com alguns controles (4) e também efeitos fixos de tempo (1) e clientes (2).

No geral, os resultados encontrados (Local inflation) apresentaram um coeficiente negativo, indicando uma relação inversa entre a inflação e o desequilíbrio compra-venda.

Tabaela de inflação local de negociações de ações

Isto é, quanto maior a inflação, menor o desequilíbrio (menos compras). Resultado que, dessa vez por meio de uma regressão, se alinha a hipótese da ilusão monetária.

Com isso, o artigo vai para a análise da heterogeneidade entre a inflação local e as negociações de ações. Algumas literaturas apontam que investidores sofisticados são menos propensos a vieses comportamentais.

Assim, os autores decidiram pesquisar se os resultados são heterogêneos entre os tipos de investidores. Foram usadas 4 variáveis dummy para capturar a sofisticação dos investidores:

  • Riqueza (Wealthy);
  • Diversificação (Diversified);
  • Empregados do banco (Bank employee);
  • Alavancagem (Levered).

Vamos entender cada um deles a seguir.

A dummy de riqueza assume o valor 1 se a riqueza do portfólio de um indivíduo for maior que a mediana das observações. O mesmo ocorre com a dummy de diversificação, que é 1 se o número de ações da carteira é maior que a mediana.

Assumindo que profissionais financeiros tendem a ser investidores mais sofisticados, a dummy bank employee assume o valor 1 se o indivíduo é um trabalhador do banco.

A quarta variável é uma dummy para identificar clientes alavancados, que vale a pena detalhar um pouco mais.

Algumas literaturas evidenciam que investidores sofisticados perceberam rapidamente que negociar alavancado aumentava os lucros durante a hiperinflação alemã.

Afinal, a dívida depreciava rapidamente devido ao aumento dos preços.

Todas as análises contendo dummies apresentaram um coeficiente positivo.

Isso sugere que a relação negativa entre a inflação local e os desequilíbrios de compra e venda é mais fraca para investidores sofisticados.

Inflação local, características dos clientes e negociações das ações

Os resultados estão de acordo com o esperado, visto que em teoria os investidores sofisticados são menos propensos a ilusão monetária.

Além de analisar a heterogeneidade entre investidores, os autores também olharam as diferenças entre as ações.

Os autores explicam que se os investidores sujeitos à ilusão monetária não se ajustam aos crescimento dos fluxos de caixa, espera-se que o efeito documentado seja mais forte para ações no qual as perspectivas de crescimento são mais importantes do que os fluxos de caixa atuais.

Nesse sentido, foram feitas algumas classificações nas ações.

Baixo (alto) rendimento são àquelas que seu rendimento médio de dividendos nos últimos 3 meses foi igual ou abaixo (acima) da mediana.

Já as empresas químicas, de energia elétrica e empresas de construção de máquinas foram classificadas como empresas de alta tecnologia.

Vale lembrar que estamos falando da segunda década do século XX.

Os autores comentam que ações com baixo rendimento de dividendos e ações de empresas de alta tecnologia provavelmente são mais suscetíveis à ilusão monetária.

A conclusão que eles chegaram foi a seguinte.

Ações low-yield e high-tech tiveram coeficientes mais negativos e significativos se comparados a ações high-yield e low-tech.

Mas afinal, qual o motivo disso acontecer?

Inflação local, características das ações e negociações das ações

A última análise do artigo consiste em avaliar a relação entre a inflação e o retorno real de ações vendidas.

Os autores explicam que em períodos de alta inflação, os investidores sujeitos a ilusão monetária tendem a vender ações, pois as percebem como supervalorizadas.

De (1) a (3) foram testados os retornos reais de ações ao longo de 3 meses após as vendas. Em (4), 6 meses.

Se essas ações estivessem realmente supervalorizadas, deveríamos observar retornos reais negativos após vendas de ações induzidas pela inflação.

Inflação local e desempenho das vendas de ações

Contudo, em todas as especificações foi achada uma relação positiva entre a inflação local no mês da venda e os retornos reais nos meses seguintes.

Ou seja, vendas em períodos de alta inflação proporcionam retornos reais mais altos do que as vendas em períodos de baixa inflação.

Dessa forma, as ações vendidas por investidores que enfrentam alta inflação tendem a estar subvalorizadas, e não supervalorizadas.

Ou seja, podemos concluir que mais uma vez os investidores estão sofrendo da ilusão monetária.

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